quarta-feira, 3 de outubro de 2012

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Senado eleva porcentual de mestre e doutor nas instituições de ensino superior

 
São Paulo - A Comissão de Educação do Senado aprovou nesta semana um projeto de lei que obriga as instituições públicas e privadas de ensino superior a ter mais professores com mestrado e doutorado. A proposta exige que 50% do corpo docente seja formado por mestres ou doutores. Hoje, a exigência é de um terço.
O PL 706/2007 ainda especifica que pelo menos 25% dos professores tenham título de doutor. O regime de trabalho com dedicação exclusiva também seria modificado: passaria de um terço para 40% dos docentes. O projeto já havia passado pela Comissão de Constituição de Justiça. Agora, os integrantes da Comissão de Educação do Senado têm cinco sessões para apresentar eventuais recursos e, se isso não ocorrer, o projeto vai para a Câmara dos Deputados.
 
De acordo com o relator, João Vicente Claudino (PTB-PI), a previsão é de que a proposta não precise ser votada no plenário. Ela deve ser analisada na Comissão de Educação pelos deputados e, se não houver modificações, seguirá para sanção presidencial. "Após a aprovação, as instituições teriam três anos para se adequarem", diz o senador.
 
O projeto, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996, é criticado pela Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes). "Não há doutores suficientes no Brasil. Além disso, as faculdades não precisam desse quantitativo de doutor", diz o consultor da Abmes, Celso Frauche.

Alto custo

Para Ana Maria Ramos, do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes) em São Paulo, é importante que as instituições privadas tenham porcentuais estabelecidos. "As particulares separam o ensino da pesquisa porque os salários dos doutores custam caro", afirma.
 
A importância da pesquisa também é defendida pelo professor da Faculdade de Educação da USP, Ocimar Alavarse. "A pesquisa é importante. Só que existem instituições que usam o título de universidade apenas para atrair alunos."
 
À Agência Senado, o Ministério da Educação (MEC) informou que, se aprovado, o projeto não vai gerar impacto nas universidades públicas, já que a maioria dos professores é doutor. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.

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Brasil ainda investe pouco em ensino superior, avalia OCDE

Levantamento aponta que os investimentos brasileiros no ensino em geral atingiram 5,55% do PIB, enquanto a meta para os países da OCDE é 6,23%
 
Em um grupo de 29 países, o Brasil ocupa o 23º lugar no ranking de investimentos no ensino superior, segundo pesquisa da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgada nesta terça-feira (11), em Paris, na França. O estudo mostra que foi investido em média 0,8% do Produto Interno Bruto (PIB) nessa etapa de ensino. De acordo com a organização, no entanto, o Brasil registrou o maior aumento de investimentos na área no período de 2000 a 2009.
O país está “gradualmente se aproximando” dos integrantes do chamado G20 (grupo das nações mais ricas do mundo). No entanto, o estudo alerta sobre o baixo investimento em educação quando há a comparação com o Produto Interno Bruto (PIB). Segundo os dados, os investimentos brasileiros no ensino em geral atingiram 5,55% do PIB, enquanto a meta para os países da OCDE é 6,23%.
A pesquisa analisou 42 países, mas nem todos apresentaram dados sobre os aspectos detalhados pela organização, daí o fato de o número de nações analisadas serem maior ou menor em determinados itens do estudo. Lideram o ranking de países que mais investem em educação a Austrália, a Finlândia, a Irlanda e a Suécia. O estudo mostra que a crise econômica internacional não afetou os investimentos em educação.
“Pessoas bem educadas vivem mais tempo, são mais propensas a votar e têm atitudes mais favoráveis à igualdade de direitos das minorias”, diz o estudo da OCDE, que pode ser consultado na página da organização na internet.
Segundo o estudo, o Brasil aumentou os investimentos totais em educação, pois em 2000 as despesas com ensino representavam 10,5% dos recursos públicos do país, enquanto em 2009 subiram para 16,8%. “Uma das taxas mais elevadas” entre os 33 países nos quais esse item foi observado, destaca a OCDE.
No período de 2000 a 2009, os investimentos em educação superior registraram redução de 2%. Paralelamente, houve um aumento médio de 67% de alunos nas universidades, de 2005 a 2009.
Outro dado da pesquisa é que as taxas de escolarização na infância registram alta, embora ainda abaixo das expectativas da OCDE. Para a organização, no entanto, o fato de 92% das crianças com menos de 6 anos estarem em sala de aula deve ser comemorado, pois em 2005, o percentual era 83%.
A organização alerta que mais investimentos em educação geram oportunidades de emprego no mercado de trabalho. Pelos dados da pesquisa, 68,7% dos brasileiros sem o ensino secundário conseguiram emprego. A taxa de ocupação sobe para 77,4% para quem tem o ensino secundário completo e 85,6% para os profissionais com ensino superior.

domingo, 30 de setembro de 2012

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Agroecologia X Agronegócio: a resistência contra o poder


agroeco e agronegoEsta é a história da luta dos novos guerreiros e guerreiras da humanidade. Não, tradicionais guerreiros armados. No caso, as armas são alimentos produzidos sem veneno, respeitando os princípios fundamentais dos sistemas naturais, não degradando o solo, aniquilando matas na beira dos rios ou no interior das terras, conservando as diversas formas de vida e, principalmente, conseguindo sobreviver. Mesmo sendo considerados os pobres do mundo. As estatísticas da ONU sempre apontam o um bilhão de pessoas que passam fome, concentradas basicamente em sete países – Bangladesch, Indonésia, Etiópia, Índia e China, os principais. Também registra as populações que não tem saneamento básico, atinge um número superior a 2,5 bilhões. Em 1974, uma comissão de pesquisadores e autoridades mundiais previa que era possível acabar com a miséria em uma década.
 
Em 1996, a ONU decidiu estabelecer uma meta menos ambiciosa: reduzir o número pela metade até 2015. Faltam três anos, e a percentagem dos famintos não caiu dos quase 15% da população mundial. Em 2001, a FAO, organismos da ONU para agricultura e alimentação, previu que demoraria 60 anos, seguindo o ritmo atual, para acabar com a fome no mundo. É também conhecida a política expansionista do modelo agroindustrial mundial, que prevê necessidade de aumentar a produção em até 60%, em face do aumento populacional – para nove bilhões em 2050.
 
Significaria, seguindo o mesmo raciocínio, um aumento de mais 120 milhões de hectares, uma área equivalente ao dobro do que os Estados Unidos plantam hoje – 64 milhões de hectares. A pergunta é óbvia: como será a expansão? No modelo industrial, seguindo o coquetel de químicos (fertilizantes), conforme a previsão dos cartéis do agronegócio a venda de fertilizantes aumentará de 120 milhões de toneladas para 180, em 2020.
 
Mais os agrotóxicos, conforme previsão da Syngenta, maior fabricante mundial, o mercado deverá crescer de US$70 para US$200 bilhões até 2025. O faturamento do próprio grupo deverá saltar de US$11,6 bilhões para US$17 bilhões, crescimento de 46%. Inclui semente e agrotóxico, na verdade é quase a mesma coisa. A planta já contém o veneno, não sobrevive, nem cresce, sem o outro.
 
Portanto, no manual das sete irmãs agroquímicas – Basf, Bayer, Dupont, Syngenta, Monsanto, entre elas-, não há nenhuma previsão de mudança em suas posturas. Muito pelo contrário, a Monsanto, líder mundial em venda de sementes transgênicas, tem comprado empresas na área de hortaliças, desde 2005. Muito menos o cartel dos processadores e compradores de grãos, reduzidos a quatro grandes grupos – ADM, Cargill, Bunge e Dreyfus, duas delas, Cargill e Dreyfus ainda sob controle dos herdeiros dos fundadores.
 
Claro, o mundo precisa de 2,3 bilhões de toneladas de grãos, contando milho, trigo e arroz, as três mais produzidas, e depois soja, em menor escala, usada, no modelo industrial, como ração para o gado europeu, galinhas e porcos na China. Também no Brasil, que é o segundo maior produtor mundial, e deve chegar a 80 milhões de toneladas, no próximo ano. Mas não são para a boca do bilhão de famintos, 75% vivendo na zona rural. O índice de “insegurança alimentar”, usando o termo do momento, é 9,3% no nordeste, enquanto a média no Brasil rural é 7%e a urbana 4,3%.
 
Na América Latina e Caribe atinge 35%, conforme o estudo recente da FAO. Não é uma coincidência: a América Latina produz metade da soja mundial, Brasil e Argentina são especialistas na produção de alimentos, mas o povo que não come, mora ao lado. Acontece que o poder dominante do agronegócio vende a ideia de que está matando a fome do mundo, como se a distribuição de alimentos fosse gratuita e generalizada. O que é uma mentira histórica. As culturas de exportações, como soja, cana, café sempre acabaram com as comunidades tradicionais de agricultores familiares, parceiros, ou trabalhadores rurais que pelo menos mantinham um quintal para plantar o feijão, milho, mandioca e algumas verduras, além da criação de pequenos animais, para o sustento da família.
 
O planeta tem uma área de 8,7 bilhões de hectares. Dois bilhões já foram detonados desde a segunda guerra mundial. Estão degradados por erosão, perda de solo, perda de nutrientes, perda da vegetação e, por último, perda de espécies naturais dos ecossistemas. Um hectare de terra do cerrado, por exemplo, tem 150 toneladas de micro-organismos, que se proliferam na mesma quantidade em que morrem. Não existe solo sem vida microbiana. As leguminosas, inclusive a soja, que fixam nitrogênio no solo, fazem por intermédio de microrrizas, que são associações de fungos e bactérias. O nitrogênio faz parte da atmosfera, mas a agricultura usa o nitrogênio processado do petróleo, ou do gás metano (CH4).
 
Por isso, o setor agrícola é citado como grande emissor de gases de efeito estufa: pela mudança no uso do solo, pelo nitrogênio liberado dos fertilizantes, pelo metano liberado pelos animais – bovinos, segundo inventário do Ministério de Ciência e Tecnologia, liberam 170 milhões de toneladas por ano. Um boi precisa comer 10% do seu peso vivo de pasto.
 
O Programa do Meio Ambiente da ONU (PNUMA) calcula que o solo, no planeta, armazena 2,2 trilhões de toneladas de CO2, três vezes mais do que a quantidade na atmosfera. Também já anunciou recentemente que 25% da área agrícola do mundo está degradada pelo uso intensivo da agricultura industrial.
 
O Brasil tem uma referência dessa degradação. A desertificação, conforme dados do Ministério do Meio Ambiente, já atinge 16% do território, atingindo 1,3 milhão de quilômetros quadrados em 1.488 municípios. E mais de 30 milhões de brasileiros. As perdas de solo alcançam mais de três bilhões de toneladas por ano. Além disso, 1.500 bacias hidrográficas precisam de intervenção. Somente nos estados de SP, PR, MG e MS foram detectadas 2.250 voçorocas (crateras no meio do campo, na beira de estradas). Uma voçoroca carrega uma tonelada de terra por ano. Em Rondonópolis (MT), a terra levada pela água para os córregos e afluentes do rio Taquari, empanturraram o rio de areia, e ele perdeu o sentido, literalmente. Espraiou e invadiu outras áreas. Rondonópolis é a sede história do Grupo Amaggi. As lavouras engoliram as matas ciliares.
 
Muito interessante também é o estudo que a UNESCO junto com o WorldWatch Institute apresentou na Rio + 10, num dos capítulos do livro “Estado do Mundo”, sobre agricultura: mundialmente os agricultores gastam 10 vezes mais fertilizantes hoje (2002) do que em 1950, com um aumento de três vezes na produção. Também gastam 17 vezes mais em valores com pesticidas (valores deflacionados), entretanto, as perdas na colheita em consequência de pragas continuam as mesmas. Daí a conclusão:
 
-“Talvez a maior comprovação da disfunção do nosso sistema alimentar seja o fato dos agricultores como grupo serem as pessoas mais pobres do planeta. Dos cerca de 1,2 bilhão ganham um dólar por dia, 75% trabalham e vivem nas áreas rurais da África, América Latina e Ásia”.
 
Só para acrescentar mais uma dado do estudo: das sete mil espécies de culturas foram domesticadas pela humanidade, apenas 30 espécies proporcionam 90% do consumo global de calorias, sendo que o milho, trigo e arroz são responsáveis por mais de 50%.
 
A História dos guerreiros
 
-“ A medida que avança o modelo exportador avançam também o empobrecimento das áreas rurais afetadas. As populações perdem o controle sobre os cultivos e os alimentos tradicionais. E perdem poder aquisitivo para poder comprar alimentos importados, que inundam os mercados a preços subsidiados da agricultura dos países ricos. Esse processo de neocolonização dos sistemas alimentares locais não é uma mera erosão da autossuficiência alimentar. Supõe também o desaparecimento de um modo de vida e uma cultura”. É um trecho do trabalho “Sistema Agroalimentar Globalizado”, de Manuel Delgado Cabeza, do departamento de economia aplicada da Universidade de Sevilha (Espanha).
 
A partir de 2003-05 terminou a época dos preços baixos dos alimentos. Chegaram a aumentar 57,1% em 2008, quando aconteceram as revoltas no Haiti, Paquistão, México, Senegal e Bangladesch. O Haiti até a década de 1970 produzia todo o arroz que consumia. Depois, em função dos empréstimos dos organismos internacionais, e a pressão pela abertura dos mercados, passou a importar arroz dos Estados Unidos, a preços subsidiados. Em 2008, o Haiti era o terceiro importador de arroz norte-americano. Acabaram com a produção interna do cereal.
 
No México aconteceu a mesma coisa com o Nafta e a abertura do milho transgênico americano. O país plantava 10 mil variedades de milho. Hoje em dia duas ou três empresas, sócias da Cargill e ADM, casos da Gruma e da Minsa compram todo o milho dos produtores e processam o milho importado. Como o preço subiu 50%, o povo mexicano tem que comprar pão de farinha de trigo, e não a tradicional “tortilla”. No mesmo período 1,3 milhão de camponeses deixaram suas terras. Foram para a periferia das cidades, ou trabalhar ilegalmente na Califórnia.
 
Manuel Cabeza também relaciona a esquizofrenia do modelo agroindustrial com os números da obesidade no mundo: 396 milhões de obesos e 937 milhões com sobrepeso, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Os americanos consomem em média 3.830 calorias por dia – o recomendável é 2.500 para um adulto. Além disso, nos últimos anos o país mais poderoso do mundo enfrentou 13 casos nacionais de contaminação ou de doenças de origem animal – contaminação em alfaces, tomates, couves, pimentão enlatados, pepinos e carne. Mais produtos com resíduos tóxicos importados da China (alimentos frescos), sem contar os casos de peste suína, vaca louca, frango com dioxina, hormônios na cadeia de engorda, ocorridos na Europa.
 
Na América Latina aproximadamente 17 milhões de camponeses com suas unidades produtivas ocupam cerca de 60 milhões de hectares, corresponde a 34,5% da terra cultivada. São propriedades em média com 1,8 hectare. A África tem cerca de 33 milhões de pequenos produtores, representam 80% de todas as propriedades da região. Com média de dois hectares. Na Ásia são mais de 200 milhões de pequenos produtores de arroz. No Brasil, são mais de quatro milhões de unidades da agricultura familiar.
 
Eles produzem a maior parte do milho, do feijão, da mandioca, enfim dos alimentos básicos. É a história dos pequenos agricultores e agora agricultoras. Na Índia, cerca de 40% das famílias no interior são chefiadas por mulheres. Esses dados são do professor Miguel Altieri, da Universidade da Califórnia.
 
“- Pequenos incrementos nos rendimentos destes agricultores que produzem grande parte dos cultivos básicos a nível mundial têm um maior impacto sobre a disponibilidade de alimentos, em escala local e regional, do que os duvidosos incrementos previstos por corporações em grandes monoculturas manejadas com agrotóxicos e com sementes geneticamente modificadas.”
 
No mundo também existem 37 milhões de hectares cultivados com alimentos orgânicos, sem uso de químicos de qualquer tipo, usando apenas os ensinamentos da agroecologia, onde trabalham 6,5 milhões de pessoas. No Brasil são 7,7 milhões de hectares com mais de 90 mil estabelecimentos registrados. Esse mundo orgânico envolve negócios de US$60 bilhões.
 
Até a década de 1980, a opção de produzir alimentos sem químicos, mas que envolve outros cuidados, era vista como uma alternativa, ou melhor, uma pequena alternativa. Nas últimas três décadas os projetos se multiplicaram, as experiências se reforçaram, o número de produtos aumentou consideravelmente, e a opção alternativa é uma realidade. Não se trata de produzir alimento sem veneno para quem tem dinheiro para comprar, como já é uma moda entre os países ricos e mesmo entre a classe média alta emergente.

Trata-se da realidade de pequenos agricultores e suas famílias, ou famílias chefiadas por agricultoras que traçaram uma nova etapa nos seus projetos. Principalmente: é uma realidade mundial. Pode ser no semi-árido brasileiro, como nos casos descritos num trabalho da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), citando a organização de produtores na Paraíba, em Pernambuco, na Bahia, ou em Minas Gerais. Ou o caso do MST, que em 2014 completa 30 anos, citando casos do Rio Grande do Sul em 327 assentamentos e mais de 13 mil famílias trabalhando com arroz orgânico – marca Terra Livre e fornecendo para a rede Pão de Açúcar -, sementes de hortaliças, leite, suco de uva e feijão. Produtos comercializados para o Programa de Aquisição de Alimentos ou para o Programa de Merenda Escolar.
 
Certamente este é um movimento que a mídia brasileira desconhece. O problema, para as elites deste país, é que este povo foi se organizando lentamente, com suas próprias forças. Nos últimos anos os canais com o governo federal foram abertos, e os dois programas citados são exemplos disso. Mas tem muito mais coisa acontecendo e que precisa evoluir. A sistematização de experiências da ANA envolve soberania e segurança alimentar. Mesmo conceito utilizado no vale do Deccan, na Índia, onde cinco mil mulheres trabalham com projetos agroecológicos e de autossuficiência.

Uma coisa é ter um, dois ou três dólares (ou reais) e comprar comida no armazém ou na bodega mais próxima. A outra é ter o alimento em casa e poder inclusive, ganhar uns trocados a mais, vendendo o excedente. Ou trocando por outros produtos. Como diz o relato do grupo de Lagoa do Pau Ferro (Ouricuri-PE):
 
-“As famílias têm acesso à água e aos alimentos em quantidade e qualidade em todas as épocas do ano, tendo soberania para escolher o que vão plantar e comer. O alimento, inclusive a água, é entendido como um direito básico de todas as pessoas, sendo isto maior e mais importante que o lucro advindo de sua renda como produto”.
 
O trabalho deles começou com 200 famílias em 2004 e hoje vendem seus produtos na Cooperativa de Produtores Agroecológicos de Araripe. Trabalham com plantas medicinais, produzem xaropes, sabonetes, e a multimistura usando ingredientes locais, ajudou a combater problemas de verminose e de visão das crianças. No Rio Grande do Sul, na região de Erechim, norte do estado, os produtores se reuniram na ECOTERRA.
 
“- Com esta cultura produtivista, com o passar dos anos, cada vez mais agricultores estão deixando o meio rural e indo para as cidades em busca de uma ‘vida melhor’. Ainda existe uma onda forte que só a tecnificação total das propriedades poderá levar a viabilização dos agricultores, como por exemplo, as integrações (aves e suínos), chamam de parceria. O sistema exclui a biodiversidade da propriedade levando os agricultores a não produzirem mais para sua autossustentação alimentar e passam a comprar fora sua alimentação”.
 
É o registro da ECOTERRA que, atualmente, comercializa os produtos em feiras diárias na cidade de Erechim e uma regional em Passo Fundo.
 
A pamonhada na casa da dona Nenê
 
É um evento no interior do nordeste, realizada em ocasiões especiais, principalmente nas festas juninas. No Polo Sindical da Borborema, envolve mais de 15 municípios no semi-árido da Paraíba, eles usam esse exemplo como encenação teatral. A pamonhada começa com o seu Chico indo buscar o milho pontinha, sementes herdadas do avô, no roçado, foi irrigado com água de cisterna, construída com o dinheiro do sistema de microcrédito comunitário. Colheram verduras na horta, irrigada com água da barragem subterrânea, cultivada usando adubos naturais, enquanto isso, cozinham a galinha de capoeira criada no terreiro, regam as plantas com água da cozinha. O vizinho elogia a diversidade de plantas no quintal e a quantidade de árvores no sítio. Podiam escolher para cozinhar no almoço feijão ou fava. Comeram doce de caju de sobremesa.
 
Enquanto isso, na casa do seu José Cosme, no agreste da Borborema é dia de plantio, mas não há semente. Vai comprar fora. A mulher compra água no carro pipa, a filha vai à bodega comprar cuscuz para o café da manhã. A terra da família é muito pequena, são obrigados a arrendar um pedaço de um fazendeiro. Cada ano fica mais fraca. Para pagar a bodega e a semente a família foi obrigada a vender o boi, mas antes espera pelo dinheiro da aposentadoria para comprar um novo bezerro.
 
A experiência da dona Nenê representa as inovações que mais de quatro mil famílias estão realizando desde o ano 2000 na região da Borborema.

Um resumo do que o povo do semi-árido reivindica: “reorientação das políticas públicas para fortalecimento da agricultura familiar, garantindo uma política agrícola que privilegie ações de convivência com o semi-árido em bases agroecológicas, apoio técnico contínuo e de qualidade, linha de crédito adequada e condições de saneamento básico, eletrificação, educação, saúde, moradia e previdência social”. Atualmente o Polo Sindical da Borborema conta com uma rede de 230 fundos já viabilizou a construção de 1.835 cisternas domésticas. Conta com 76 bancos de sementes comunitárias que beneficiam diretamente três mil famílias. Desde 2004 em parceria com a CONAB foram armazenadas 161 toneladas de variedades locais.
 
O MST, comemorará os 30 anos na Copa do Mundo em 2014, fez um balanço dos 327 assentamentos, em 41 municípios, onde vivem 13.535 famílias. Na região de Bagé, municípios de Candiota, Hulha Negra, além de Livramento, Viamão e as Missões, 200 famílias trabalham com a produção de sementes em 42 grupos. Na safra de inverno (2011) produziram 10 toneladas de hortaliças de 74 variedades, além de 35 toneladas de forrageiras. Na cadeia produtiva do arroz ecológico: 407 famílias, 28 grupos e quatro cooperativas em 12 municípios. Na safra 2011/12 a previsão de colheita era de 285 mil sacas.
 
Na produção de leite, média de 35 litros por família, 4.400 famílias envolvidas, volume recolhido em Tupã foi de 5,9 milhões de litros, em Hulha Negra e Candiota mais 5,4 milhões e em Livramento outros 5,2 milhões. A comercialização dos produtos é feita para os programas PAA e PNAE. Na merenda escolar atendem 255 escolas na região metropolitana de Porto Alegre, em Livramento em 11 escolas, em Tupã, o Laticínio Santa Maria atende 200 escolas em 11 municípios. A comercialização direta é realizada em quatro feiras em Canoas, região metropolitana, cinco feiras em Porto Alegre, duas em Eldorado, duas em Nova Santa Rita e uma em Viamão. Uma cooperativa de técnicos com 127 profissionais trabalha no assessoramento, ainda mantêm quatro escolas de nível médio e 65 de ensino fundamental.
 
(*) Matéria reproduzida da Carta Maior.

Economia Solidária

Movimentos sociais debatem política de agroecologia com governo federal
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Por Eduardo Sá,

Movimentos sociais e organizações da sociedade civil integrantes da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), se reuniram, no Palácio do Planalto, em Brasília, com o Ministro da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, e o Ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, para discutir os encaminhamentos da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO). O decreto 7.794 foi sancionado no dia 21 de agosto pela presidenta Dilma Rousseff, e agora será instituída uma Comissão Nacional com 28 representantes (14 do governo e 14 da sociedade civil) que irá elaborar propostas para o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, que deve ser elaborado até o final de fevereiro de 2013.
 
De acordo com Gilberto Carvalho, o governo quer valorizar a participação dos movimentos sociais no processo de construção da PNAPO e a Comissão Nacional, de composição paritária, será muito importante daqui para frente. Ele destacou ainda que outros espaços, como o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), têm contribuído de maneira crítica e autônoma nos últimos 9 anos.
 
“Grandes e importantes propostas que nós conseguimos forjar e pôr em andamento devemos exatamente à participação da sociedade, sobretudo quando conseguimos organizar os canais adequados. Agora a Secretaria Geral será referência na coordenação inicial desse processo, junto com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA)”, afirmou.
 
Na visão de Pepe Vargas, Ministro do Desenvolvimento Agrário, com a publicação do decreto uma etapa foi vencida estipulando questões essenciais dessa política, como conceitos, critérios, instrumentos e a Comissão Nacional, que garante a participação social. É preciso agora instituir uma câmara interministerial, sob coordenação do MDA. Ele apontou avanços no decreto, como o capítulo que trata das sementes crioulas.
 
“No que diz respeito ao MDA, não vemos razão de interrompermos alguns programas, como as chamadas de Ater (Assistência Técnica e Extensão Rural). Devemos até outubro lançar as chamadas públicas de Ater para agroecologia, e a partir desse ano colocar um eixo da sustentabilidade nas chamadas de Ater em geral”, afirmou.
 
Cerca de 20 pessoas de movimentos sociais do campo participaram da reunião. Segundo Eugênio Ferrari, do núcleo executivo da ANA, os movimentos que participaram dessa construção sempre tiveram clareza que a conjuntura não era favorável, pois a tendência do governo é o fortalecimento do modelo agrícola hegemônico, o agronegócio. No entanto, enfatizou que é importante reforçar algumas políticas que têm contribuído para o avanço da perspectiva agroecológica, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), e que a política de agroecologia deve consolidar e ampliar esses mecanismos.
 
“Temos clareza que uma política de agroecologia deve ser voltada para o conjunto da agricultura familiar e dos povos e comunidades tradicionais. Com essa estratégia, construímos na ANA propostas de ações prioritárias e medidas. Assim participamos até o final de maio, mas quando o decreto foi lançado ficamos surpresos porque o processo de diálogo foi interrompido. Ficamos surpresos e insatisfeitos com a ausência da referência à função social da terra, que é o elemento fundamental e base física da agroecologia, assim como a ausência da questão da promoção universal à água, reafirmada como um bem de domínio público. A proposta de participação social também ficou restringida em relação à proposta formulada entre o governo e a sociedade civil”, criticou.
 
Na avaliação dos movimentos, a questão das sementes materializa um avanço nesse diálogo, mas é preciso retomar a agenda das questões prioritárias para atingir avanços substanciais na agroecologia. Outra reivindicação é que a comissão paritária para a construção do Plano Nacional tenha caráter eminentemente político, com subcomissões técnicas. Romeu Leite, presidente da Câmara Temática Nacional de Agricultura Orgânica, reforçou que não saiu o decreto que as organizações esperavam, mas as discussões serão retomadas também através Câmara Temática, que se dividiu em três grupos (econômico, tecnológico e mercados). “Nós acreditamos que os participantes da comissão nacional têm que ser os que estão envolvidos nessa história”, ressaltou Leite.
 
As organizações ficaram surpresas com o lançamento do decreto durante o Encontro Unitário dos Trabalhadores, Trabalhadoras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas, realizado em Brasília em agosto. De acordo com Rosângela Cordeiro, do Movimento das Mulheres Camponesas (MMC), foi realizada uma atividade de agroecologia durante o encontro, com mais de 30 organizações presentes.
 
entrega organico ministros
“Foi entregue uma moção feita nesse encontro, estamos com muita preocupação porque esse tema é muito caro para nossa vida camponesa, autonomia, soberania alimentar, e é fundamental que pontos como terra e território estejam fortemente presentes numa política de agroecologia. Estamos dispostos a ajudar, porém é preciso ter uma sensibilidade maior. Ao invés de nicho de mercado, tem que ser de enfrentamento ao capital em defesa dos nossos bens comuns. Para uma agricultura que sustenta esse país, produz 70% da comida, que é a agricultura camponesa. Mas há opções muito claras no governo para o agronegócio”, disse.
 
“Tem que estimular as feiras, porque no meio rural tudo está sendo feito por grandes empresas e os grandes supermercados compram da Ceasa. As feiras livres começam a perder espaço, é preciso estimulá-las. É preciso rever a política de crédito”, observou Francisco dal Chiavon, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
 
De acordo com Denis Monteiro, secretário executivo da ANA, duas questões foram destacadas nas propostas formuladas e apresentadas ao governo, que devem estar na agenda de trabalho da comissão nacional: é necessária a construção de um plano nacional de sementes crioulas que consiga acabar com a erosão genética e reduza os transgênicos, além de um plano nacional de redução dos agrotóxicos. “Não é possível que a situação continue do jeito que está, somos os maiores consumidores de agrotóxicos do mundo. Então, essa política tem que ter isso na sua agenda de trabalho. Porque a situação é contraditória com a proposta da política de agroecologia, é preciso avançar muito na questão de políticas públicas que promovam uma agricultura sem venenos e na vigilância das grandes empresas”, propôs.
 
Presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e também integrante da ANA, Maria Emília Pacheco observou que não há soberania alimentar e nutricional sem a garantia da terra. Segundo ela, é preciso ousadia por parte do governo, pois desde 1988 não temos um marco que garanta os territórios dos povos e comunidades tradicionais.
 
“Nao é só ampliar as unidades de conservação, as reservas extrativistas, que é um avanço e podemos dar exemplos, mas também realizar desapropriações para a reforma agrária. A terra é um tema atual. E concordamos no Consea que é fundamental no Brasil um plano de redução de agrotóxicos. A questão das feiras, por sua vez, é preciso gerar uma descentralização do abastecimento, considerar as feiras, sobretudo agroecológicas, como equipamentos de segurança alimentar. Por fim, necessitamos de programas para o reconhecimento do papel das mulheres na liderança de processos agroecológicos”, analisou.
 
Pontos de vista do governo
 
Há um entendimento que o arcabouço jurídico formal brasileiro recepciona boa parte das propostas dos movimentos da sociedade civil, mas não elimina a disputa política e a correlação de forças dentro do governo, como no congresso e no judiciário, para essa construção, observou o Ministro do Desenvolvimento Agrário. Segundo ele, é possível seguir em frente com o que foi construído até agora, com seus avanços e insuficiências.
 
“Precisávamos quantificar os conjuntos de políticas públicas que foram constituídas nos últimos anos para agricultura familiar e camponesa, pois nenhum governo fez isso. Temos que debater isso com os movimentos, para analisar o tamanho da prioridade que se dá ou não. Eu acho que não é só um problema do governo, a gente procura um modelo mas também tem que disputar entre os próprios produtores. Tem uma parcela dentro da produção familiar que não é agroecológica, precisamos conquistá-la. Com uma política nacional podemos ganhar mais gente, se não o modelo da revolução verde vai continuar hegemônico”, concluiu Vargas.
 
Gilberto Carvalho, por sua vez, destacou que é importante uma relação tensa com o governo, se não seria falsa, e a intenção é pressionar dentro da máquina pública para obter avanços.
 
“Tem, por exemplo, insumos orgânicos para o grande latifúndio. Não veremos isso como um nicho de mercado da classe média, precisamos de fato fazer um processo de grande alteração. Mas o problema também está dado na sociedade. Então temos que lutar contra o uso intensivo de agrotóxico, a contaminação da água. Não há tema interditado entre nós, o decreto não sinaliza a falta de profundidade, na prática vamos discutir isso. O importante é uma visão nossa de ambição, pensar grande, ocupar espaços dentro do governo e, sobretudo, na sociedade. Temos dificuldades dentro do governo para aprovar os insumos orgânicos, enquanto os químicos são aprovados com muita força e lobby. É uma batalha, e precisamos estar juntos”, finalizou.
 

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Contag pressiona por respostas efetivas do governo federal
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A direção da CONTAG esteve reunida no dia 27/09 na Secretaria Geral da Presidência da República com o ministro Gilberto Carvalho e seus assessores. O encontro foi para discutir o monitoramento das medidas anunciadas pela presidenta Dilma em resposta à pauta de reivindicações do Grito da Terra Brasil (GTB). “Estamos cumprindo um cronograma para discutir o monitoramento do que foi efetivado, ou não, pela equipe do governo. Existem pontos centrais que precisam de acompanhamento e outros que simplesmente não foram implementados pelo governo”, esclarece Alberto Broch, presidente da CONTAG.
 
Os pontos centrais da discussão versaram sobre Políticas Sociais (controle do uso dos agrotóxicos, cadastro do segurado especial, previdência social, educação do campo, proteção infanto-juvenil e educação infantil do campo), Reforma Agrária (desapropriações, regularização fundiária, Programa Nacional de Crédito Fundiário, assentamento de jovens, idosos e assalariados rurais, desenvolvimento e créditos para assentamentos e licenciamento ambiental) e Política Agrícola (Assistência Técnica e Extensão Rural – ATER, Programa de Garantia de Preços Mínimos da Agricultura Familiar – PGPM/AF, Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária – SUASA, tributação de insumos, Plano Safra, territorialidade, economia solidária, cooperativismo e associativismo e o Programa Nacional de Habitação Rural - PNHR).
 
A CONTAG pressiona pelo encaminhamento do que ainda não foi resolvido e do que é demandado por sua base e que corresponde a políticas estruturantes. Na ocasião, o presidente da confederação entregou duas cartas ao secretário da presidência. Uma produzida por orientação do ministro Mercadante e que diz respeito ao PRONACAMPO. O outro documento trata do desenvolvimento do campo e é uma solicitação de audiência com a presidenta Dilma, expressando a insatisfação da CONTAG com o posicionamento da mesma sobre a questão da reforma agrária.
 
Visivelmente sensibilizado, o ministro Gilberto Carvalho comprometeu-se a atuar diretamente em relação a diversos pontos apresentados. “Alguns desses assuntos são sagrados para nós e vamos até o fim para resolvê-los”, compromete-se. Uma segunda etapa da reunião entre os assessores de ambas as partes para tratar de pontos específicos ficou de ser agendada para os próximos dias. Na sequencia, se dará um encontro entre os dirigentes sindicais e o ministro, desta feita para tratar de questões mais políticas.
 
FONTE: Imprensa Contag - Maria do Carmo de Andrade Lima